O meu amiguinho
Sei que ele está indo embora, é só uma questão de tempo. Está mais fraquinho a cada dia, alimenta-se mal, come sem apetite. Cabisbaixo, calado, triste, tão diferente de outros tempos, não passa agora de uma sombra do que costumava ser. Sempre achei chato olhar para ele pelas grades da gaiola, mas com o tempo me habituei. Ainda que possa parecer egoísta, eu ficava reconfortado por saber que ele estava ali, pertinho de mim. Sua companhia me fazia bem e eu só posso agradecer por tanta generosidade. Com a presença dele, a solidão pesava menos. E, quando ele cantarolava, eu juntava minha voz à dele e éramos os dois mergulhados numa só melodia.
A vida prática, porém, ensina que não é bom tomar-se de tanto carinho pelos bichinhos de estimação. Quando eles morrem, a gente fica só, desarvorado. A gente fica sem chão e tudo passa a não ter mais sentido. Como acontece agora. Meu amiguinho está indo embora e eu me sinto muito triste. Perdi a melodia, minha garganta secou. Minhas penas vão logo perder a cor e o brilho. Agora só penso com qual dos dois filhos do meu amiguinho eu vou ficar. O mais velho nunca se importou comigo. Talvez o mais novo queira me levar, não sei.